08
Voltei para o apartamento
à noite. Liguei para o Bernardo e combinei de tomar o café da manhã com ele.
Bernardo conhecia há mais tempo a família Baum. Ele deveria saber de alguma
coisa. Aquela historia toda não estava cheirando bem. Afinal de contas quem era
este Sr. Ângelus? E que negocio ele tinha com o finado Anderson. Muitas
perguntas e nenhuma resposta. Encontrei
dificuldades para pegar no sono, mas por fim consegui.
Na manhã seguinte, quando
tomamos café juntos, comentei com Bernardo:
- Você conhece um sujeito
meio estranho chamado Ângelus?
- Isso é nome – ele disse
-, não conheço ninguém com um nome desses. Pergunte ao padre, parece até nome
de anjo.
E começou a gargalhar.
- Estou falando serio!
- Eu também! Fale com o
padre.
E continuou a rir, quase
se engasgando com o café.
- Mas por quê? –
perguntei.
- Só tem um problema.
- Qual?
- Simplesmente ele não
pode falar. Nenhum padre pode falar.
E ficamos apenas olhando
um para o outro. De repente o ar da sala havia ficado pesado. Ele largou a xícara
na mesa e acendeu um cigarro. Falando pausadamente:
- Você acredita que
algumas coisas que acontecem por acaso. Na verdade não existe acaso.
- Acredito em qualquer
coisa.
Aí ele resolveu se
levantar e eu o acompanhei. Fomos até os fundos da funerária. Ficamos andando
entre os caixões no deposito. Parava na frente de cada caixão e explicava nos mínimos
detalhes do que era feito e em qual tipo de situação era usado. Bernardo
conhecia sua profissão como ninguém. Ele falava com paixão e orgulho. Lembrava o
nome de cada morto que já tinha passado por ali.
Bernardo olhou para mim. E
apontou para o caixão que estava ao lado.
- Este é perfeito pra você.
- Não obrigado. Ainda não
estou precisando.
Ele falava como um
alfaiate. Mostrava os caixões, como quem mostra ternos em uma loja.
- Olha o acabamento desta
tampa, foi toda esculpida na mesma peça de madeira. Não tem nenhuma parte
colada ou pregada.
Percebi que não íamos chegar
a lugar nenhum. Fui andando até a frente da loja. Parei na entrada e fiquei
observando a rua através da vitrine. As pessoas passavam pela calçada como se
nada tivesse acontecido. Como se nada estivesse acontecendo. Desviavam o olhar
da vitrine. Numa total negativa da possibilidade da morte. Apenas as crianças,
paravam na frente da loja e espiavam para dentro através da vitrine. Elas tinham
esta curiosidade a respeito do desconhecido.
Essa funerária estava ali
desde quando eu podia me lembrar. Lembrava-me que já conhecia o local desde
sempre. A única funerária da cidade. Todos que morriam na cidade passavam por
ali. Bernardo era o ultimo lugar que alguém ia antes de virar comida dos vermes
e ser esquecido no fundo de alguma cova ou mausoléu.
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