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Decidi que já era hora de
ir embora. A garota tinha sumido. Quem eu estava tentando enganar? É provável
que ela tenha se entediado com minha conversa. E agora deveria estar
conversando e rindo em algum grupo. A festa estava toda dividida em grupos.
Apenas eu continuava sozinho, sem afinidades e deslocado.
Monica passou mais uma
vez pela sala, dava alguns passos, parava, conversava, sorria, algumas vezes
parecia gargalhar, tocava no ombro de um e de outro convidado. A anfitriã era o
centro das atenções, um merecido destaque já que a casa, o aniversario e os
amigos, tudo a sua volta a pertencia. Notei que apenas ela usava vermelho, um
lindo vestido vermelho. Seu vestido contrastava com a cor sóbria e cinza das
vestimentas dos convidados. Como eu não tinha reparado nisso antes? Eu deveria
estar nervoso quando entrei na festa, mas agora estou entediado. E começo a
reparar nos detalhes.
Poderia ir até a outra
sala conversar com Daniel e deixar ele me apresentar a seus amigos. Mas não
gosto de conversas rasas, e não tenho muito assunto. Onde esta a garota? Penso.
E no mesmo instante ela surge na porta, vindo em minha direção. Para o meu
alivio. Ela voltou! Sorridente e mais linda do que antes. Como digo “a fome é o
melhor tempero”, eu já estava faminto por sua companhia.
- Desculpe a demora – ela
disse -, mas tinha uma fila enorme para o toalete.
- Nem percebi que você
demorou.
- Não percebeu?
- Percebi sim, já estava
quase cortando os pulsos.
- Exagerado....hehehe.
- Verdade. Quase pedi
para o garçom chamar a policia. Pensei que tinham lhe sequestrado. Ou quem sabe
abduzida. Eu já estava quase indo lhe procurar.
- Você é muito exagerado.
– ela disse e deu uma bela gargalhada.
- Apenas por você.
- Desse jeito vou ficar
convencida.
Começamos a brincar com
as palavras, nos provocar. E a noite parecia que tinha voltado à vida. O calor
da sua presença era algo contagiante. Meu bom amigo garçom voltou a cena,
trazendo copos novos e mais cerveja.
- Pretende passar a noite
toda ao lado da mesa?
- É que estou controlando
a distribuição dos alimentos.
- Você sempre fala assim.
- Nem sempre, apenas
quando eu gosto da pessoa.
- Gosto da sua ironia.
- Estou adorando lhe
provocar. Eu adoro fazer as pessoas rirem. Sou meio palhaço.
- Você é modesto, apenas
meio.
- Pelo visto também
gosta.
Até aquele momento ainda
não tinham servido o bolo. Um aniversário sem bolo e velas, não é um
aniversário. Esperei o garçom servir uns convidados que estavam ao lado. E
perguntei a ele.
- A que horas vão cantar
os parabéns?
- Daqui a pouco, senhor.
- Pensei que íamos ficar
só naquele discurso.
- É que a senhora ainda
está esperando chegar alguns convidados.
Olhei o relógio, já
passava das onze horas.
- Mas quem é que chega a
meia noite numa festa?
- Não sei senhor, com
licença.
- Pode ir amigo, mas não
se esqueça de voltar com mais cerveja.
Esperei ele se distanciar
e comentei com Caroline.
- Você escutou o que ele
disse?
- Sim, mas não é de se
estranhar.
- Quem esta faltando?
- A Monica tem muitos
amigos e clientes que são artistas, e eles sempre se atrasam.
- Bom, eu também sou e
cheguei na hora.
- Cada um tem a sua hora.
- Verdade, mais um motivo
para eu ficar de vigia ao lado da mesa.
- Vai acabar engordando
desse jeito.
- Na verdade estou usando
apenas como apoio para o copo.
- Você não imagina a fila
que estava no banheiro.
- Agora você começou a
falar o meu idioma, aquele negocio de toalete me parece. Deixa pra lá melhor
não comentar.
- Você não é tão grosso
assim.
- É uma mascara.
- Logo percebi. Gostaria
de ver os seus últimos trabalhos.
- Se quiser podemos ir
agora.
- Outro dia combinamos.
- Pra você tenho todos os
dias livres.
- É uma cantada?
- Entenda como quiser.
Apenas não me abandone de novo. Esta festa ficou horrível quando você saiu.
- E porque não foi se
enturmar, tem muitas pessoas legais aqui.
- Sei...
Enquanto ela falava não
conseguia parar de olhar para os seus olhos e boca. Seus olhos transpareciam em
pura energia e jovialidade. Sua boca de lábios carnudos e sensuais exacerbava
uma feminilidade incrível e vigorosa. Era a perfeita combinação de força e
delicadeza. Nunca tinha visto ou estado com uma mulher assim antes. E sua
inteligência emoldurava todo o contexto. Tudo o que me atrai em uma mulher ela
tem nas doses exatas e perfeitas. Principalmente o fato de entender as minhas
piadas. Fiquei um bom tempo divagando e analisando a situação. Não sou do tipo fácil,
mas ali já estava pronto para casar com ela e ter uma meia dúzia de filhos, uma
casinha no campo e começar a pintar paisagens campestres. Até que ela perguntou.
- O que você esta pensando?
Esta com uma expressão tão pensativa.
- Estava pensando se ainda
vai demorar.
- O que?
- Para servirem o bolo, já
esta ficando tarde e amanhã eu preciso me acordar cedo.
Tive que mentir, não podia
falar a verdade.
- Humm...- ela disse com ar
pensativo, como se não tivesse ficado muito convencida com a minha mentira.
- Mas tudo bem. Vou sobreviver
mesmo que tenha que sair daqui direto para o trabalho.
- Pensei que estava gostando.
- Estou sim, não me interprete
mal.
- Agora fiquei confusa.
- Por quê? Perguntei.
- Não sei...
Nossa conversa entrou por
um caminho estranho. Aquele abismo que separa a comunicação entre homens e mulheres.
Eu deveria ter sido sincero. De alguma forma ela percebeu a mentira. Mas como ela
não sabia a verdade. A situação ficou estranha. Muitas coisas podiam estar passando
na minha cabeça, e ela sabia que não entendia. Eu precisava consertar aquele mal
entendido.
- Posso ser sincero?
- Deve!
- É meio constrangedor, mas
acho que fiquei deslumbrado com você.
- Mas nem nos conhecemos.
- Por isso mesmo. É uma bobagem,
vamos esquecer.
- Você quer esquecer?
- Não.
- Não precisa ficar constrangido.
Fiquei lisonjeada, apenas acho que você deveria me conhecer mais.
- Vou adorar.
Ela segurou a minha mão. Por
um minuto parecia que íamos nos beijar. Então Daniel apareceu na porta acenando
para mim e roubou a cena.
- Acho que aquela pessoa esta
lhe chamando. Ela disse.
- É o meu “amigo”.
- Você não vai lá?
Acenei de volta que já iria.
- Não sei o que ele quer.
- Se você quiser pode ir,
eu fico esperando.
Ele continuava na porta. Acenando
como se tivesse urgência.
- Eu não demoro.
- Não vai esquecer-se de mim.
- Pode deixar, com certeza
deve ser alguma bobagem. Eu já volto.
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