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DICA DO DIA

A ULTIMA VIRGEM


A ULTIMA VIRGEM


As 6:45 a mulher perfeita se acorda e se pergunta: -Porque que o mundo é assim?
Era agora ou nunca, o tempo estava acabando. “oito milhões de mulheres para um homem” aquela frase tinha colado entre os neurônios da Sabrina, como se tivesse sido colado com cola quente, aquilo fazia seu cérebro ferver.
Todos os dias se acordava e ia até o banheiro e enquanto escovava os dentes ficava reparando nas raízes brancas que iam se multiplicando. Ela pensava que até os 45 anos ainda estava tudo bem, mas agora já ia fazer 51 anos e a flacidez do rosto progredia de uma forma assustadora, quase já não conseguia se reconhecer. Os homens da sua idade saiam com mulheres de 30 anos, as vezes até menos. O que lhe sobrava era os com mais de 60 anos, mas eram tão velhos fisicamente e emocionalmente, que achava aquilo muito injusto. Eram todos uns velhos chatos e caquéticos metidos a garotões. E muito, muito ranzinzas. Velhos mesmos, com mau hálito e tudo mais. Raspavam a cabeça para parecerem jovens, mas tinham aqueles braços flácidos, aquela barriga, aquele aspecto de velhos. Aquele tão de pele de quem já estava morto, e o cheiro de quem não tomava banho de forma regular. Velhos e ridículos e sebosos.
“Oito milhões de mulheres para um homem”, ela nunca estudou estatísticas, mas aquilo parecia ser uma verdade genuína. Pensou em uma plástica, a maioria de suas amigas já tinham feito alguns procedimentos. Não tinha o dinheiro como a maioria das suas amigas. E tinha medo de dar errado, e tinha medo de ficar com a cara parecida com as que via na televisão e nas revistas, aquelas mulheres de cem mil plásticas que não pareciam ser humanas, mas um tipo grotesco de personagem de desenho animado. Envelhecer pelo menos com dignidade ela pensava. Sua vida estava cheia de pensamentos.
Seu ex-marido a havia trocado por uma criança de 24 anos, vinte anos de casamento e agora tinha sido substituída por uma universitária. Pior, a garota estava gravida, pensava “O cretino nunca quis ter um filho e agora com essa pirralha está todo bobo porque ela está gravida. Tomara que não seja filho desse filho da puta. Tomara que o cornei muito! Vai meter uns belos pares de chifres nele com certeza! E depois vai ir embora com um homem mais novo! É o que elas fazem! Quero ver chorar quando for trocado, por um homem mais novo!”. Aquele pensamento lhe dava um certo alivio, voltou para “a pista” como dizem. A procura de um novo parceiro. Nada fácil, difícil, muito difícil, como ela mesma dizia “Oito milhões de mulheres para um homem”, e são todas umas vadias oportunistas. Mas é o que eles querem, serem explorados.
 Pensou aonde poderia conseguir um homem decente que quisesse uma mulher decente. Começou a frequentar uns cultos porque uma amiga havia lhe recomendado. Difícil, muito difícil.
Apelou para a fé e começou a sair com um homem de Deus, evangélico e batizado nas águas do Guaíba, mesmo com a placa indicativa de “águas poluídas”. Na cama era um bom amante, pervertido e sem medo de ousar, mas tinha um problema “a culpa”. Depois que terminavam de gozar o sujeito vinha com um longo e enfadonho discurso sobre culpa e pecado. Ela só queria um homem que a fudesse bem e depois não ficasse lhe enchendo o saco, mas aquela água do Guaíba poluída deve ter afetado o cérebro dele.
Tentou a academia, sujeitos bonitos, sarados que cultuam o corpo. Mas logo percebeu outro problema, precisava concorrer com outros homens, aquilo não parecia ser justo já que não podia entrar no vestiário masculino. Conheceu o Felipe, bom sujeito bissexual de família tradicional e que tinha sua própria empresa. Mas a bissexualidade do rapaz se dividia de uma forma injusta, não era 50% a 50%. Ele preferia 99% outros homens e deixava apenas 1% para suas dúvidas em relação as mulheres.  Ela começou a sentir que o rapaz queria uma mãe, uma amiga, mas não uma mulher.
- Qual foi o problema? Ele disse.
Sabrina resolveu comprar uma bicicleta e ir passear na orla do Guaíba. Ficava pedalando e contando o número de casais que passavam. Convidou sua melhor amiga para pedalarem juntas. Mas Eduarda estava sempre enrolada em um dos seus relacionamentos. Enquanto não tinha ninguém a amiga não conseguia dar conta dos inúmeros casos. “Como ela conseguia ser assim, - Sabrina falou baixinho enquanto pedalava – fica me trocando por qualquer par de calças que aprece. Mui amiga.” Pedalou tanto que conseguiu lesionar a panturrilha.  O médico lhe deu um atestado, uma semana de molho em casa com a perna para cima. Percebeu que o apartamento era muito grande para apenas uma pessoa. Resolveu comprar um gato. Seus pensamentos agora tinham um foco, cuidar do bichano como se fosse um filho, parente, amigo, pai, mãe. Mas o gato continuava sendo um gato. Passava horas falando do novo companheiro para as amigas. As amigas a compreendiam porque também tinham gatos.
- Os gatos são os melhores companheiros do mundo! São independentes! Ela falava com fervor, sentindo-se completamente dependente das novidades que o bichano aprontava.
Fora isso, continuava com o mesmo mantra lhe martelando o cérebro “oito milhões de mulheres para um homem” esse pensamento pode enlouquecer uma mulher.
Saiu para comprar ração e quando voltou viu a cena mais deprimente da sua vida. O gato estava esticado no pátio do edifício, estático, imóvel, um filete de sangue saindo de sua boca. Juntou o animal ainda com o corpo mole e levou para dentro, carregou ele como se carregasse seu próprio filho, o filho que ela nunca teve, porque seu ex-marido nunca quis ter, vinte anos juntos e nem um filho. Esqueceu do saco de ração no pátio, esqueceu que tinha deixado uma das janelas abertas.
Eduarda tinha lhe avisado para botar telinha nas janelas. Ficou sentada em seu sofá confortável, com o bichano no colo, puxou para perto do seu corpo uma almofada e apoio a cabeça dele delicadamente sobre ela, como se ele ainda pudesse sentir alguma coisa. Chorou tanto ali sentada a tarde toda até perder completamente a noção de tempo. A noite veio, a sala ficou escura, o telefone não parou de tocar, até ficar mudo, e ela continuava ali. Parada sem saber o que fazer. Alisando o pelo do gato. Esperando um milagre.
Ficou de luto por três dias e depois voltou a procurar as amigas. Seu projeto de felicidade tinha que seguir em frente. Voltou a frequentar bares e cafés com as amigas. As conversas continuavam sempre as mesmas, os mesmos temas, as mesmas decepções, os mesmos dramas. Até o café continuava com o mesmo gosto de café.
Pensou estar ficando deprimida, resolveu fazer terapia. A psicóloga lhe diagnosticou com depressão e ansiedade. Sabrina achou tolice, mas continuou. Suas amigas também iam na psicóloga, então estava tudo certo. Fazia parte do mundo, fazia coisas do mundo e de seu ciclo de amizades. Se sentiu normal. Custava caro fazer parte da atualidade, teve que pedir ajuda ao ex-marido para pagar as consultas. O mínimo que podia fazer por ela, ainda mais que todos os problemas era culpa dele. Além da terapia a psicóloga lhe receitou um bom psiquiatra. Começou a tomar antidepressivos. Na mesa com as amigas, em um café ou bar, agora tinham um novo assunto, terapias e comprimidos.
Uma amiga lhe sugeriu um garoto de programa, já que não conseguia um homem, quem sabe pelo menos um garoto que a comesse bem. Mas olhando o jornal viu uma manchete de uma mulher de sua idade que tinha sido encontrada morta num motel e que provavelmente tinha sido o amante. O garoto de programa. Depois pesquisou mais e ficou com receio de apelar para os serviços de um profissional. Difícil, muito difícil.
Os encontros com as amigas sempre lhe rendiam boas ideias.
Outra amiga lhe falou das sexshop e das maravilhas que um vibrador poderia fazer. Comprou alguns e se satisfez por algum tempo. Mas aquilo também não era o suficiente. Objetos de látex e o barulho infernal. Difícil, muito difícil. Como alguém conseguia gozar com um troço daqueles? A sensação era boa, mas o barulho lhe brochava. 
Para as amigas ela começou a se mostrar como uma sabia que sabia tudo a respeito de relacionamentos e aonde estava o problema.
- A culpa é dos homens! Não se fazem mais homens como antigamente! Ela dizia.
Enquanto as amigas concordavam. “Os homens são o problema!”.
Em casa sozinha ela pensava como iria conseguir um homem. “Oito milhões de mulheres para um homem”.
Assinou alguns canais de filmes pornôs, e com os dedos conseguia resolver sua ansiedade e seus desejos. Mas os vídeos com o tempo também perderam a graça. E os comprimidos para depressão e ansiedade lhe dificultavam muito para chegar ao clímax.
Uma amiga que já tinha passado por tudo isso lhe deu um ótimo conselho. “Não se preocupe logo, logo você perde o tesão e fica tudo mais tranquilo, nem vai precisar mais de um homem, veja eu, tenho 55 anos e nem fico mais molhada e nem sinto mais tesão. É uma maravilha.”
Sabrina ficou horrorizada com a ideia de não ficar mais molhada e com tesão. Ela queria sentir muito tesão e gozar muito, até o final de sua vida. Mas aonde encontrar um parceiro legal naquela altura da vida? Sentiu como se sua vida fosse murchando dia após dia.
Começou a se sentir como uma espécie de viúva sem defunto para chorar. Pior o defunto estava bem vivo e dormindo com uma ninfeta de 24 anos. E feliz da vida porque seria papai. Chorou novamente se lembrando do gato e daquela tarde que esqueceu a janela aberta.
Nunca em sua vida tinha pensando em cometer um crime, mas aquele cretino do ex bem que merecia uma morte lenta ou pelo menos ficar brocha. Seria irônico, completamente brocha na cama com a ninfeta, pensou e sorriu secando as lagrimas na manga do blusão. Um sorriso de prazer que a muito ela não sentia. O desgraçado vai ficar brocha e cheio de chifres. Esse pensamento lhe fazia bem.
- Antes de eu ficar seca ele vai ficar de pau mole! Ela disse e se levantou para se olhar no espelho da sala. A maquiagem do rosto toda borrada. Foi tomar um banho para esperar a visita de sua amiga. Que agora tinha tempo de lhe visitar. Uma daquelas brechas entre um relacionamento e outro. Eduarda chegou no horário combinado e as duas ficaram na cozinha preparando café e conversando a respeito da fragilidade dos relacionamentos modernos.
- Aplicativos de relacionamento? Ela perguntou a amiga.
- Sim, você baixa o APP no celular é muito fácil de usar.
- Você não acha estranho isso?
- Não, é como uma revistinha de cosmético, você olha o produto, lê a descrição e se gostar da uma curtida.
- E funciona?
- Ah, sim amiga, funciona e muito. É logico sempre tem umas malas, mas como lhe disse, você escolhe o produto. E se não gostar é só deletar.
- Tempos modernos esses né!
- Não está fácil para ninguém.
A amiga ajudou a instalar o aplicativo e a escolher suas melhores fotos e a bolar um textinho de apresentação. Começou um novo martírio para Sabrina, que já não sabia o que fazer, deixou-se ir pela dica da amiga. No primeiro dia já tinha cinquenta pretendentes. Ficou muito eufórica, tratou logo de ligar para a amiga e contar a novidade. Estava se sentindo a mulher mais poderosa e irresistível do mundo. Aquele tipo de mulher que estufa os peitos e grita “empoderamento”, mesmo não sabendo o significado da palavra. Já que todo mundo grita mesmo, porque ficaria de fora dessa casta de pessoas inteligentes, que usam palavras fortes e inteligentes. Lembrou-se das tardes de terapia e dos conselhos da psicóloga.
Sua felicidade durou exatos segundos até abrir o aplicativo e começar a olhar as fotos e as descrições, a cada foto ela suspirava uma reclamação. E seu polegar ia apertando no “X” e não no “coração”.
“Casado”
“Casal”
“Mulher”
“Psicopata”
“Idiota”
“Louco de pedra”
“Pervertido”
“Tarado”
“Dinossauro”
“Garoto de programa”
“Bissexual”
“Lésbica”
“Veado”
“Isso é gente”
“Crente”
“Satanista”
“Filhinho da mamãe”
“Chinelo”
“Metido a besta”
“Miserável”
“Playboy”
“Gordo”
“Seco”
“Narigudo”
“Asqueroso”
“Bolsominion”
“Petista”
“aborto da natureza”
“Isso aí tá procurando alguém”
“Sem sal”
“Brega”
“Quatro olhos”
“Feio”
“Bonito demais”
“Certinho demais”
“Grosseiro”
“Delicado”
E assim seguiu até analisar o ultimo perfil. Difícil, muito difícil. E a amiga tinha feito um perfil tão bonito, usando aquelas fotos de estúdio que lhe custou uma grana e as outras, lugares bacanas e caros. Nem a descrição perfeita do que procurava ajudou. Apareceu apenas aquela gente horrível. Desesperada por sexo e se encostar em alguém com dinheiro. “Lixo, tudo lixo” ela disse. Apenas queria um homem normal e dentro dos seus padrões. Mas “oito milhões de mulheres para um homem” não ajudava em nada. Difícil, muito difícil.
Fechou o aplicativo e começou a chorar de raiva, não conseguia acreditar que o mundo tinha se transformado naquilo.
Continuou dia após dia escorraçando todos os pretendentes que surgiam no aplicativo.
- Daqui a pouco vai aparecer um alienígena! Ela gritou deletando mais um pretendente.

Eduarda a convidou para tomar um café.
- E aí amiga, já arranjou um Crush? Eduarda perguntou.
- Não sei como você acha legal esse aplicativo, - ela disse – só tem uns tipos estranhos.
- Você está sendo muito exigente, não acha?
- Eu não sou muito exigente, só não quero qualquer um. Não vou sair por aí com quem não conheço. E, é sempre os mesmos papinhos. Acho que eles só querem sexo mesmo.
- Mas você não sai com ninguém.
- Essa história não é para mim. Acredita que teve um que me convidou para ir para o apartamento dele tomar um vinho e ver um filme.
- E você não foi? Ele era interessante?
- Nas fotos parecia bem bonitinho, mas eu não estou desesperada para ir assim direto, ele nem me convidou para dar uma volta antes.
- Amiga qual o problema?
- Não vou sair por aí dando para qualquer um!
- Mas você não está com vontade? Quanto tempo que não transa?
- É claro que estou com vontade, já faz cinco meses que terminei com o Felipe. Que decepção!
- Cuidado que a vida passa rápido.
Terminaram o café, Sabrina se despediu da amiga e voltou para seu apartamento. Abriu o criado-mudo retirou o álbum de casamento e ficou folheando as páginas.
                                                               Röhrig C.

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