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DICA DO DIA

SEU PASSAPORTE ERA OS PEITOS


SEU PASSAPORTE ERA OS PEITOS


Ninguém na cidade poderia negar que Rosalva era uma mulher de peitos, filha única do Dr. Herculano Fonseca, médico, fazendeiro e viúvo. A garota dominava toda a cena da pequena cidade e seus casos amorosos eram famosos. Não existia um sujeito na cidade que ela já não tivesse agarrado. Solteiros, casados, viúvos, meio aparentados, não importava, todos já lhe tinham passado sobre sua revista e crivo. Era de uma pluralidade, que se desconfiava que até algumas mulheres já tinham caído sobre seus encantos e sedução.
Dizem que até nas árvores da praça, empoleirada, já tinha sido vista transando, feita um bicho no cio, para o mais puro deleite de quem passava por debaixo das árvores, seus gemidos quebravam o silêncio da noite da pequena cidade. Como uivos de uma loba no mais profundo cio. A quem diga que ela era descendente direta da loba que fundou Roma. Uma espécie única de mulher perfeita.  As outras mulheres da cidade tratavam de espalhar suas façanhas, com tamanho ciúmes e covardia. Que apenas fazia seu nome habitar os mais profundos desejos dos homens que viviam em seus casamentos constipados e mornos. Era o assunto principal e se não o único do lugar.
Seu pai depois que a mãe morreu, virou uma espécie de eremita, não saia mais da fazenda. Se tornou um homem recluso e amargo, com apenas uma alegria, a filha querida que o visitava. Nada sabia a respeito da vida da filha, e não demonstrava nenhum interesse também. Para ele apenas a vida na fazenda bastava e a espera do retorno da sua herdeira. A filha o visitava de tempo em tempo, com a mesma doçura e fragilidade da pequena menina, que para ele sempre seria sua pequena e inestimável criança. Isso bastava para o doutor fazendeiro. A filha que sempre voltava a casa paterna. Doce menina. Eterna menina.  A mais pura criatura que poderia existir na terra.
Com parte da herança que recebeu pela morte da mãe, comprou uma casa bem no centro da cidade e um carro. Tinha cansado daquela monotonia da fazenda e queria lugares mais movimentados.
Já tinha terminado seus estudos numa faculdade que ficava a uma hora de viagem, numa cidade maior e mais movimentada, naquela cidade sim ela se divertia, uma vida boêmia e universitária.
Mas agora estava contente com sua casa ao lado da praça, podia ver os carros passando na rua e as pessoas caminhando, bem melhor do que ficar olhando apenas para o campo e o gado.
Quando queria matar a saudade da boemia, pegava o carro e partia em direção a outra cidade. Lá podia se divertir e ser um pouco discreta, a não ser quando encontrava conhecidos que também iam para lá se divertir.
Uma coisa ninguém podia negar a garota era um ótimo partido, qualquer um que se encostasse ali teria sombra e água fresca pelo resto de seus dias. E com sorte um divórcio muito vantajoso.
Mas aos 30 anos ela achou que tinha chegado a hora de casar. Começava assim o seu martírio, casar com quem? Quem seria capaz de esquecer o seu passado? E porque precisava esquecer o passado? Nunca deveu nada a ninguém, sempre pagou por tudo que quis e em dinheiro vivo.
Por sorte um novo escritório se instalou na cidade, trazendo alguns funcionários de fora. Mas antes de se aproximar de algum daqueles rapazes, sua fama chegava sempre primeiro. Como uma maldição, ela começou a achar que não existia nenhuma solução para o seu caso. Seria necessário mudar de cidade.

Na mesma época Marcelo estava sendo transferido da capital para a pequena cidade, se despediu da esposa e partiu.
Mas antes foi conversar com um velho amigo e sábio que lhe deu alguns conselhos a respeito de como as coisas acontecem no interior.
“No interior só existe dois tipos de mulher que você precisa tomar cuidado, são as casadas e as solteiras.” O conselho do velho Agenor não saia da cabeça do rapaz.  Mas Marcelo era casado, então aquilo não deveria significar um problema, e além do mais estava apenas de passagem pela cidade. Precisava se manter firme pelos próximos 12 meses, convictos e casto como um puritano em sua jornada, sobrevivendo a todas as provações.
Rosalva viu Marcelo desembarcar na pequena rodoviária, e já foi pedindo a ficha completa do rapaz para seus amigos. Vagamente conseguiu descobrir que ele deveria estar ali por causa do novo escritório.
A partir daquela tarde, ela começou a se fazer presente em todos os lugares que o rapaz ia. Marcelo notou aquela linda morena de peitos aparentemente lindos e firmes. Ficou em um dilema entre as palavras do velho amigo, sua esposa que o esperava na capital e aquela mulher que o atraia de uma forma que ele mesmo não se reconhecia, passava horas pensando nela.
Os amigos novos logo avisaram.
- Já andou com todo mundo! Não presta! É só para diversão. Todos diziam de forma unanime e convincente, lambendo os beiços.
Mas já estava seduzido. Os conselhos não serviam para muita coisa. Para sua sorte tinha o dom da fraqueza e da covardia de um bom hipócrita. Que dá valor ao que os outros vão pensar a seu respeito, mais valor do que a própria verdade dos fatos. Conseguiu construir um muro intransponível de aparências, intimamente se sentia triste e contaminado.
A garota já não sabia o que fazer, tinha tentado todas as artimanhas da sedução sem nenhum sucesso.
- Quem ele pensa que é? Ela se perguntava baixinho.
Rosalva teve uma grande ideia, seu aniversario estava perto e resolveu dar uma festa em sua casa nova. Convidou todos os amigos e alguns parentes, fez com que os amigos de Marcelo o convidassem para a festa. Seria na festa que ela daria o xeque-mate. Como uma aranha que tece sua teia para devorar o pequeno inseto, tratou de todos os detalhes até os mínimos. Queria deslumbrar o rapaz e mostrar para ele o mundo que estava disposta a lhe proporcionar.
Todos na festa ficaram deslumbrados, mas Marcelo não apareceu. Alegou que estava com uma forte dor de cabeça.
Aquilo não estava nos planos da garota. No meio da festa ela desabafou com os amigos.
- Quem ele pensa que é, - ela disse, sentindo uma profunda raiva – vou esfregar meus peitos na cara dele! Quero ver se ele não vai me querer!
No outro dia Marcelo ficou sabendo que a garota tinha ameaçado esfregar os peitos em sua cara. Ele apenas riu se sentindo nostálgico e amarrado a princípios pequenos.
A vida na pequena cidade seguiu o natural rumo, até que a empresa resolveu mandar um novo engenheiro.
Fernando era um jovem recém-formado, engenheiro, com uma aparência de ator de Hollywood, metido a conquistador, e com a índole de um bom canalha. Sorriso fácil e palavras dissimuladas marcavam seu perfil. Logo que desceu na pequena rodoviária avistou Rosalva e percebeu que ali estava um ótimo partido. A garota acabava de descer de seu carro importado e de luxo. E entrava na loja do outro lado da rua. Aquela visão monetária e bela o fez ficar parado por um instante.
Depois foi até o escritório e se apresentou, para assumir o cargo de chefe. A empresa tinha um ano para terminar a estrada que ligava a cidade a outro município.
Rosalva ficou sabendo do novo engenheiro e investiu no mesmo momento. Em quatro dias os dois estavam namorando. Marcelo já tinha virado passado. O engenheiro sem pensar duas vezes e se achando um conquistador irresistível, investiu todas as suas fichas. Em menos de seis meses já estavam casados. E os trabalhos na estrada continuavam atrasados.
Fernando não deixava Marcelo em paz, estava sempre lhe dizendo como deveria conquistar uma mulher. Um assunto que ele achava ser um especialista. E quando ficou sabendo de toda a herança envolvida, investiu cada vez mais em seu perfeito casamento. O casamento entre Rosalva e Fernando parecia ser um milagre, duas pessoas tão parecidas e unidas por laços matrimoniais e financeiros.
Ninguém na cidade se atreveu a contar a história da garota. Depois do casamento, Rosalva começou a envenenar Fernando até conseguir a demissão daquele que a negou e que ela nunca conseguiu esfregar os peitos. O único homem que ela não conseguiu meter as mãos, melhor dizer, meter os peitos.
Marcelo partiu com o aspecto de quem parte aliviado por partir, mas no seu intimo uma parte ficou na cidade. Se ele não fosse tão covarde, talvez as coisas tivessem tido outro desfeche. Aquele par de peitos não saiam de sua cabeça.
Voltando para a capital, não conseguiu mais reconhecer em seu casamento e em sua esposa, algum elo que pudesse continuar unindo. A falta de dinheiro e a convivência diária fez o casamento ruir.
Após a separação começou a viajar de cidade em cidade, de estado em estado, até ir embora do país.
Acostumou-se a viver uma vida sem raízes, indo de um lugar para o outro, até que descobriu que estava com câncer e resolveu voltar. Já tinham se passado vinte anos desde a ultima vez que esteve em Porto Alegre.
Marcelo em sua volta para o Brasil, cruzou no aeroporto com Rosalva e seu marido. Ela já não era mais a mesma e Fernando parecia um cantor de opera, gordo, com uma monstruosa barriga e calvo. Mas o que mais impressionou Marcelo foi seu olhar taciturno e vago. Ali estava um homem derrotado por suas vaidades de uma juventude bela e forte. Massacrado pelo cotidiano de uma cidade pequena. A garota também havia mudado muito, tinha perdido suas formas, já não se podia dizer aonde terminava os peitos e começava a barriga.
Mas Rosalva ficou impressionada, ele tinha mudado muito pouco, um pouco mais grisalho, e ainda mantinha o mesmo brilho nos olhos azuis que a impressionaram tanto. E continuava magro e sem barriga.
Trocaram algumas palavras, ficou sabendo que o casal ainda morava na mesma cidadezinha e que só saiam de lá nas férias, quinze dias no máximo a cada ano, para algum lugar ali perto. E que era a primeira vez que vinham a capital, mas não tinham achado nenhuma graça no lugar. Marcelo se despediu e foi pegar o táxi, enquanto o casal ficou no saguão aguardando a chegada do filho que estudava nos Estados Unidos.
“Está poderia ter sido minha vida.” Pensou Marcelo enquanto entrava no táxi, “ainda bem que não foi” completou.
                                                                   Röhrig C.

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