CONCORRÊNCIA
E OUTROS DRAMAS
Gostava de ir para seu
apartamento, ela tinha um escritório bem montado em um dos quartos e um bar
sempre cheio de garrafas, podia me servir de tudo, tanto do escritório quanto
do bar e dela. Apenas não podia fumar no escritório, então tinha que sair até a
sacada e dar uma olhada na noite porto-alegrense. Seu único defeito era sua
carência de menina rica. Como as pessoas ricas são carentes, nunca vou entender
esse jogo. Ela realmente achava que ia conseguir me ter apenas por causa do seu
dinheiro e suas promessas de me ajudar. As vezes parecia muito fútil outras
vezes adorável. Na cama uma puta, na sala uma dama. O tipo de mulher que adoro.
Duas vezes por semana era o máximo de tempo que aguentava ficar ali. Depois do
tesão vinha sempre o tedio e a vontade de voltar para a rua. Seus dramas
financeiros, me davam vontade de vomitar.
- O que você fez hoje? Ela disse.
- Andei trabalhando em uns
contos novos. Eu disse.
- Você é tão inteligente,
porque não procura um trabalho.
- Isso ia estragar tudo
querida, não tenho muito tempo para perder realizando os sonhos dos outros.
- Está com fome? Quer algo
especial?
- Não tenho fome, qualquer coisa
está ótima, sabe que não ligo para comida.
- Você precisa se cuidar já não
é mais nenhum garoto.
- Sim, sim. Poço pegar uma
dose de uísque?
- Não precisa pedir né!
- E você o que fez hoje?
- O de sempre.
- Legal. Eu disse e fui até o
bar me servir de um pouco de uísque, duas doses para começar.
A decoração do apartamento me
incomodava muito, todo moderno, brega, cheio de moveis e coisas da moda, mas
nenhum estilo pessoal, parecia que ela tinha comprado o apartamento pronto. Aquilo
estava mais para um catálogo de novidades do que um lugar para chamar de lar. Muito
frio.
- Você gostou do quadro novo?
Fiquei olhando aquela parede
cheia de quadros, sem saber qual era o novo.
- Qual querida? Eu disse e
voltei a me sentar ao seu lado. Larguei o copo na mesinha de centro e peguei um
daqueles pezinhos pequenos, tirei seu sapato e comecei a massagear.
- Sabe o que o meu pai falou? Ela
disse.
- O que foi que ele disse
dessa vez? Eu disse.
- Um absurdo, ele falou que
não vai pagar nossas férias na Espanha. Ele não gosta de você.
- E quem quer ir para a Espanha?
- Mas querido eu quero muito
fazer essa viagem, preciso viajar, não aguento ficar presa em Porto Alegre.
- Então você vai e me conta
depois como foi.
- Mas quero que você vá junto,
vai gostar.
- Vou gostar se conseguir
pagar o aluguel do quarto no próximo mês.
- Mas eu pago a viagem para a Espanha.
- Quer dizer, seu pai.
- Não importa!
Fiquei imaginando o que estava
fazendo da minha vida, massageando aqueles pés tão delicados. Eu podia estar simplesmente
escrevendo, bebendo e fumando no meu quarto. Sem me preocupar com as suas
vontades e seus dramas familiares. Ela tinha comprado um quadro novo para eu
admirar. E não consegui identificar naquela parede cheia de quadros. Estou só
me ferrando com essas mulheres e seus dramas.
- Acho que vou fazer uma pizza,
- Ela disse e se desvencilhou das minhas mãos – que sabor você quer?
- O que você quiser.
Duas horas depois estávamos deitados
em sua cama.
- Você gosta da maneira tosca
que lhe pego. Eu disse.
- É que os caras do meu meio
são muito afeminados e estão sempre só pensando em seus próprios umbigos e em
quanto de dinheiro vão ganhar e naquela merda de carros esportivos. Mas você é
diferente, você me come com vontade e gosto disso.
- Vai ver é porque só tenho
uma bicicleta e moro num quarto alugado.
- Mas se quisesse você podia
vir morar aqui, tem bastante espaço.
- Pode acreditar, se eu viesse
morar aqui ia faltar espaço.
- Tolice temos todo um andar
para nós.
- Nossa amizade não iria sobreviver,
já lhe disse que fui casado durante 17anos. Sei bem o que estou falando. Como
naquela propaganda daquela loja, apenas me use e está tudo certo.
- Você não é quem diz ser, e
você sabe disso né?
- Só não espalhe se não, não
vou conseguir vender os meus livros.
- Então você pode vir para cá.
E passar o dia todo escrevendo.
- Não ia funcionar e você sabe
que não ia funcionar.
- Porque?
Comecei a rir de sua
ingenuidade. Ela estava querendo alguém que se aproveitasse dela e lhe desse em
troca algumas migalhas de carinho e afeto. Mas duvido que aguentasse o cheiro
do cigarro que ia empestear seu lindo apartamento.
- Sabe quantas mulheres já
esfregaram seus sobrenomes e saldos bancários e posições sociais na minha cara.
Muitas, e eu corri de todas, isso não funciona comigo. Talvez funcione com o
seu próximo marido. E se acontecer, apenas dê umas fugidas no meu quarto para
matarmos a saudade.
- Eu não lhe entendo, não
estou pedindo nada. Quero apenas que a gente fique junto e se curta.
- Está sim, está pedindo a
minha liberdade. E sinto muito, mas isso não é possível de ser negociável. Não
pelo preço que você quer pagar. Vai ter que melhorar a proposta. E treinar umas
posições novas.
- Você é muito romântico!
- Sou um maldito romântico pode
acreditar, e tenho toda essa merda de princípios que colaram em minha cabeça.
Não ia funcionar.
A noite ia ser de psicólogo de
xota, já estava sentindo. E ainda ela queria que me mudasse para ali. Não tinha
como funcionar. Afinal de contas qual seria o maldito novo quadro naquela
parede cheia de quadros. Não tinha a menor chance de funcionar.
- O seu ex-marido era só um
veado que precisava de uma mulher bonita para manter as aparências. Fazer o
que, essa é a genética dele. E você consentiu. Devem ter sido felizes durante
alguns anos. Mas eu me pergunto enquanto ele saia com seus amiguinhos porque
você não procurou alguém para lhe fazer companhia. Vocês poderiam estar casados
e felizes até hoje.
- Ele não era tão veado!
- Sei, ele só gostava de pegar
os executivos novos e dar um brilho em suas carreiras.
- O que você sabe?
- So o que você me contou. As vezes
acho até que você deveria voltar a procurar ele.
- Você é louco, ele me
maltratava!
- Mas pelo menos conseguia ir
para a Espanha com maior facilidade.
- O que isso tem a ver?
- Apenas uma ideia, podia ser
interessante.
Depois de um pouco de realidade
ela ficou braba comigo. Voltei a massagear seus pés.
- Vamos mudar de assunto e
falar um pouco de putaria, qual foi a coisa mais louca que você já fez?
Ela parou seu olhar como se
estivesse pensando, tentando se lembrar de suas putarias.
- Então esse sujeito veio com
um papinho que era concorrência. Ela
disse, e abriu a gaveta para mostrar sua pequena coleção.
- Que idiota, vejo seus
brinquedinhos como aliados e não como concorrentes. Eu disse.
- Tinha que ver a cara dele, -
ela disse – parecia até que ele estava olhando para uma pervertida.
- Eu curto esse seu jeito
pervertido de ser. Eu disse e pisquei o olho esquerdo para ela.
Começamos a rir, e ela foi
tirando seus brinquedinhos do criado-mudo e espalhando pela cama. Uma grande
coleção. Comecei a usar eles na sequencia que ia tirando do criado-mudo,
enquanto ela ia gemendo, o som dos seus gemidos aumentando. E estávamos de novo
de boas, depois de algum tempo ela relaxou. E estava tudo bem.
- Vamos dormir? Ela disse.
- Estou a fim de escrever um
pouco. Eu disse, e fui até o banheiro dar uma mijada.
- O que vai fazer?
- Estou mijando!
- Não diga isso é feio, não
gosto. É muito rude.
- Estou fazendo xixi!
- Vamos dormir?
- Depois eu vou, fique a vontade
querida, preciso apenas colocar umas ideias no papel.
- Vê se não demora, não
consigo dormir sem você.
- Vou tentar ser rápido.
Sai do banheiro e vim correndo
para o escritório enquanto as ideias ainda estão frescas. Acabei trazendo uma
garrafa daquele bom uísque e agora estou fumando um cigarro na janela e olhando
a noite la fora. Na esperança que ela não sinta o cheiro de cigarro e comece
com toda aquela ladainha. Já tinha visto muitas mulheres com seus vibradores,
mas ela realmente tem uma coleção e tanto. Se um sujeito não conseguir se
adaptar a esses tempos modernos vai ficar para trás. Não da para concorrer com
a tecnologia. Somos apenas mais um vibrador que não precisa de pilhas e nem cabos
de usb, e com grandes possibilidades de falhar. Seria muita sacanagem escrever
um conto contando a história dela e a minha. Sou um cara muito sacana. Mas pelo
menos nunca uso os nomes verdadeiros.
Já tinha passado um bom tempo
e eu consegui me libertar de toda aquela atmosfera. Estava agora viajando em
meus próprios pensamentos.
Apaguei mais um cigarro, na
janela e joguei fora a bituca e ela começou de novo. Quebrando toda aquela
atmosfera de uma noite silenciosa na capital do rio grande do sul.
- Você não vem para a cama? Já passa das 3h da madrugada.
Ela disse.
- Só um momento, querida, eu já vou. Eu disse.
- Foi o que disse a uma hora atrás.
- Eu sei só um momento.
- Então eu vou dormir.
- Isso mesmo pode dormir, já vou.
Aonde estava mesmo, humm. Sim, escrever mais um capítulo. O
tempo está se esgotando e as ideias não estão vindo. Daqui a pouco ela se
acorda de novo e vai começar tudo de novo. Difícil conseguir escrever alguma
coisa assim. Deveria ter ido para o meu quarto. E ela com aquela coleção de vibradores e um ex-marido que poderia
pagar sua viagem para a Espanha. Enquanto que o meu drama não passava do próximo
aluguel. Humanos demasiadamente humanos.
Melhor ir dormir e esquecer tudo.
Röhrig C.
Do livro: Cidade Baixa e suas Mulheres Altas “Um
escritor na Cidade Baixa”
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