Pular para o conteúdo principal

DICA DO DIA

com prazer VI - Um convite inusitado


Um convite inusitado

Meu cigarro apagasse, enquanto eu fumo. Jogo ele na sarjeta. A chuva aperta um pouco mais e vamos para debaixo da marquise. São 23h e a rua está deserta. A garota tira um lenço da bolsa e tenta secar inutilmente os cabelos encharcados.

- Você acha que vai chover mais? Eu disse.

- Quem sabe, mas acredito que não. Ela disse.

- Mas como pode ter certeza?

- É que agora apertou mais a chuva e isto é sinal de que ela vai passar.

- Você acha?

- Sim, se ela continuasse calma ia durar a noite toda.

- Entendo.

Tirei outro cigarro da carteira e voltei a fumar. A cada minuto a chuva apertava mais, parecia que o mundo ia desabar em nossas cabeças. Ela tremia de frio e sorria, dando pequenos pulinhos e esfregando as mãos tentando se aquecer.

- Desde que horas você está aqui? Perguntei.

- Eu Venho sempre às 18h, quando já está escuro.

- E fica até que horas?

- Depende do movimento, hoje por causa da chuva eu vou embora mais cedo.

- Tenho visto você todas as noites aqui, você nunca tira uma folga.

- Tem noites que eu não venho, deve ter sido coincidência você me ver sempre aqui.

- Pode ser.

Termino o cigarro e jogo no chão a bagana ainda acesa e piso em cima, apagando com a sola do sapato. Fico olhando a garota, ela se vesti com pouca roupa, apenas uma mini-saia de brim e uma blusa pequena de alças, seu umbigo fica a mostra com um pequeno metal cravado nele, parece uma tacha. Do outro lado da rua um carro estaciona, o motorista abaixa o vidro e faz sinal com a mão para a garota. Ela atravessa a rua correndo, e se aproxima do carro. Os dois ficam conversando por alguns segundos. Ela volta pra marquise e o carro vai embora.

- O que houve? Pergunto.

- O canalha queria me comer de graça, da pra acreditar.

- De graça?

- É, o playboy com aquele baita carrão, não quis pagar os R$35,00.

- Você cobra R$35,00.

- Para uma completa sim, e ele queria pagar R$20,00.

- Vai ver ele tava sem dinheiro.

- Não é isso, eles estão sempre querendo pagar menos, e não podemos ceder se não se acostumam mal.

- Mas você não acha que seria melhor estar em um quarto quentinho agora do que estar embaixo desta marquise com frio e chuva.

- Eu já estou acostumada, não ligo.

A chuva continuava aumentando, tirei do bolso uma garrafinha e ofereci um trago para ela. A garota tomou metade da garrafa em um gole só, tive que tirar a garrafa de sua mão. Antes que secasse.

- Calma! Eu também quero tomar um gole.

- Desculpe.

- Tudo bem – eu disse -, mas parece que não vai parar de chover.

- Parece.

- Vou dar mais um tempo e depois vou para casa.

- Você mora aqui perto?

- A umas duas quadras.

- Pra você eu poderia fazer por R$20,00, o que acha?

- Quer me dar um desconto?

- Você parece ser legal, e simpatizei contigo.

- Estou sem dinheiro, mas obrigado.

- Posso abrir uma exceção e você não precisa pagar – ela disse -, tem mais bebida em casa?

A chuva começou a diminuir, ficou uma garoa fina e gelada, coloquei o meu braço para fora da marquise e senti a chuva gelada em minha mão.

- Podemos ir então – eu disse -, mas vamos agora que acalmou.

- Só um minuto.

- O que foi?

- Vamos deixar passar aquele carro primeiro.

Olhei para trás e na outra esquina dava para ver as luzes do farol de um carro entrando na avenida, o carro passou devagar, o motorista olhando para ela. Assim que passou começou a acelerar e seguiu pela avenida.

- Podemos ir agora. Ela disse.

- Noite difícil hein! Eu disse.


Caminhamos as duas quadras, tentando desviar da chuva, nos escondendo embaixo das marquises, e andando de forma apressada. A garota andava de uma maneira desengonçada em cima de seus saltos altos, escorregando nas lajotas das calçadas. Pisou numa merda de cachorro e quase caiu no chão escorregando, para sua sorte ela conseguiu se apoiar em meu ombro, e conseguimos manter o equilíbrio.

- Chegamos! Eu disse, parando em frente à porta do antigo casarão que eu alugava.

- Você mora ai?

- Sim.

- Eu passo todos os dias aqui na frente.

- Em que região você mora?

- No fragata, em frente ao cemitério, conhece?

- Sim – eu disse -, mas vamos entrar. Abri a porta e entramos na casa.

Segui por um corredor escuro e estreito até os fundos, eu alugava uma peça no fundo do casarão, uma peça com banheiro. Entramos na peça e peguei duas toalhas para nós secar. A garota não parava de tremer, liguei a estufa e pedi para ela tirar a roupa molhada. Ela ficou nua enrolada em um cobertor, enquanto eu trocava a minha roupa e colocava uma seca.

- Quer tomar um café?

- Quero – ela disse -, posso te pedir um favor?

- Claro.

- Eu queria tomar um banho, posso?

- Sim, o banheiro é ali atrás daquela porta. Toma teu banho enquanto eu preparo o café.

- Obrigada.

Ela entrou no banheiro e eu fui ligar o fogareiro para esquentar a água. Enquanto ela tomava banho passei o café.

- Que cheiro gostoso! Ela gritou do banheiro.

- É bom um cafezinho! Respondi.

- Já estou saindo.

- Não tenha pressa, pode ficar a vontade.

- Obrigada.

Tomamos o café, sentados no colchão, ela continuava nua enrolada no cobertor, enquanto suas roupas ficavam secando em cima da estufa a óleo.

- Você quer me comer? Ela perguntou.

- Não. Respondi.

- Se quiser, eu não lhe cobro, você foi muito gentil.

- Obrigado, mas não estou com vontade.

- Tem certeza, pra mim não é problema.

- Para mim também não é.

- Você é quem sabe, já estamos aqui mesmo.

- Eu sei.

A chuva tinha voltado a aumentar, dava para escutar a chuva caindo no telhado, o mundo estava desabando, logo as ruas iam ficar inundadas. Terminamos o café e continuamos conversando, ela contou um pouco da história dela e de como tinha ido trabalhar na rua.  E eu contei um pouco da minha história, como eu tinha chegado até aquelas peças. Histórias comuns de duas almas miseráveis.

- Posso te pedir mais um favor?

- O que?

- Posso ficar aqui hoje?

- Eu só tenho este colchão, mas podemos dar um jeito.

- Obrigada.

Arrumamos as cobertas no colchão de solteiro, e tirei a minha roupa, ficamos os dois nus embaixo das cobertas, deitados lado a lado de barrigas pra cima. Ela se virou para o lado de fora do colchão, olhando para a porta do banheiro. E disse: - Você pode se encostar-se se quiser.

Eu encosto-me a ela e sinto o calor de seu corpo junto ao meu. Ela pega a minha mão e puxa por cima de seu corpo, colocando-a apoiada em sua barriga, sinto o metal no seu umbigo.

- Boa noite. Ela disse.

- Boa noite. Eu disse.

Comentários

Promoção de livros

743355678ae871043d48337fc70c9a8a--romances-auto

Ebook Amazon

É muito amor envolvido – Quando nasce um romance – LIVRO – Röhrig

Se preferir uma edição impressa clique no logo da Agbook 
 

Ofertas:

Postagens mais visitadas deste blog

10 livros imperdíveis de Fiódor Dostoiévski em português (PDF) Grátis para baixar

10 livros imperdíveis de Fiódor Dostoiévski em português (PDF) Grátis para baixar                                                         » Assine nosso canal do  Youtube  e aprenda mais sobre literatura. «  Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski [nota 1] [nota 2]   Moscou / Moscovo ,  30 de outubro  de  1821  -  São Petersburgo ,  28 de janeiro  de  1881 [1] [2] [3] [4] [nota 3]  foi um  escritor ,  filósofo  e  jornalista  do  Império Russo . É considerado um dos maiores romancistas e pensadores da história, bem como um dos maiores "psicólogos" que já existiram (na acepção mais ampla do termo, como investigadores da psiquê). [5] [6] [7] Entre outros temas, a obra do autor explora o significado do sofrimento e da  culpa , o  livre-arbítrio , o  cristianismo , o  racionalismo , o  niilismo , a pobreza, a violência, o assassinato, o altruísmo, além de analisar  transtornos mentais , muitas vezes ligados à humilhação, ao  isolamento , ao  sadismo , ao  masoq

Forma ou fôrma - qual o correto?

As palavras  forma   e   fôrma   existem na língua portuguesa e estão corretas. Podemos utilizar a palavra forma (com a vogal o aberta) como sinônimo de feitio ou para referir a forma conjugada do verbo formar e as palavras fôrma e forma (com a vogal o fechada) como sinônimo de molde. A utilização do acento diferencial é facultativa desde a entrada em vigor do Novo Acordo Ortográfico.   Exemplos – forma (timbre aberto):  Mexer é a forma correta de escrita desta palavra, porque é com x e não com ch.  Sua boa forma é invejável!  A professora forma a fila dos alunos no pátio da escola.  Exemplos – forma (timbre fechado) ou fôrma:  Você tem alguma forma de bolo para me emprestar?  Você tem alguma fôrma de bolo para me emprestar?  Este sapato tem uma forma pequena.  Este sapato tem uma fôrma pequena.  Antigamente, o acento circunflexo era usado para diferenciar a palavra forma (o aberto) da palavra fôrma (o fechado). Contudo, a reforma ortográfica de 1971 aboliu a utilização de acentos

fundo transparente para criar imagem PNG

---------------------------------------------------------------- ------------------------------------------------------------------ passe o mause em cima da parte branca entre as duas linhas tracejadas , clique com o botão direito do mause  e copie o fundo transparente para criar imagem PNG