EFEITO
WERTHER (16)
Senti um alivio quando voltei
para a rua. Novamente estava inteiro em minha solidão. Procurei a ponta mais
distante no balcão do bar, longe dos outros clientes e pedi uma cerveja.
Parecia ser uma manhã agradável, o garçom largou o copo e a garrafa na minha
frente e foi conversar com os outros clientes. Enchi o primeiro copo, e dois
sujeitos se sentaram nos bancos a minha esquerda. O tom da voz deles era tão
eloquente que pareciam dois oradores, disputando a atenção do público. E o
único publico que estava ali próximo era eu, para minha infelicidade.
- Dinheiro não trás
felicidade. O que estava do meu lado disse.
- Verdade, você viu o
noticiário? O outro perguntou.
- Do assassinato do
empresário?
- Viu, não adianta ter
dinheiro. É cada coisa que acontece nessa vida.
- Para que ter tanto dinheiro,
se no final nem aproveita.
- Bem jovem ele era.
- Verdade, dinheiro só atrai
problema. Prefiro a minha vida simples, no final de semana faço um churrasco e
convido a família.
- Isso que é viver!
Os dois tolos continuaram
conversando, justificando, suas misérias, para eles mesmos e para mim, que
preferia apenas ignorar a existência deles. Meus pensamentos estavam divididos,
de um lado as lembranças de Sofia, e o fato de que começava a acreditar que ela
não iria mais voltar. Do outro lado tinha a Patrícia que me fazia bem, sua companhia
era agradável. Mas, não me sentia seguro com nenhuma das duas. Faz muito tempo
que não me sinto seguro, ou com motivos para acreditar em alguma coisa. Senti um
pouco de ciúmes da banalidade dos sujeitos, suas vidas pareciam ter algum
significado patético.
- Você vai ir no jogo
sexta-feira? O do meio disse.
- Não vou poder ir, estou sem
dinheiro e vou precisar fazer umas hora-extras. O da ponta respondeu.
- É complicado não ter
dinheiro.
- A inflação está um absurdo,
os preços dos alimentos mudam toda a semana, a patroa só reclama.
- A minha também. Tem dias que
da vontade de jogar tudo para o ar.
- E você vai no jogo?
- Nesta sexta-feira, não vou
poder ir, minha mulher vai ficar cuidando da tia no hospital e eu vou ter que
ficar com as crianças.
- Que merda, nosso time vai
ficar desfalcado.
- Verdade.
E assim seguiram a conversa,
num momento dinheiro não trazia felicidade, no outro, a falta de dinheiro
estava deixando os dois muito infelizes. E eu que estava me lixando para a vida
inútil dos dois tinha que aturar aquela conversa, com uma pontinha de ciúmes.
O do meio falava com o outro e
olhava para mim esperando que eu concordasse com seu discurso.
Um deles fez um sinal para o
garçom pedindo para ligar o televisor. Estava sintonizado no canal de esportes.
Além de darem seus discursos sobre economia, agora estavam dando uma aula sobre
futebol, pareciam dois técnicos experientes. Cada jogada errada que passava no
televisor, eles tinham uma teoria de como os jogadores deveriam fazer. Não
tinha jogador e nem técnico que fosse bom o bastante para eles. Para minha
sorte a cerveja terminou e pude sair daquele manicômio. Deixando para trás suas
vozes e a voz do comentarista esportivo, os três definitivamente se mereciam.
(15)
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