EFEITO WERTHER (03)
O garçom acabou trazendo o café, fiquei ali sentado do lado de fora da cafeteria, o único lugar que ainda se pode fumar. Tudo bem, posso concordar, que o cigarro pode me causar um câncer, mas eu não sou um câncer.
Do outro lado da rua aquela figura sombria meio gótica grunge, teoricamente um mendigo. Atravessou a rua e veio em minha direção. Francoa veio já de longe acenando e gesticulando, com uma euforia digna dele e apenas dele.
- Meu amigo! Ele disse, e abriu os braços para um abraço carinhoso de irmãos.
Olhei seu aspecto e senti o cheiro. Voltei a observar o café na xícara, peguei a pequena colher e dei algumas voltas dentro da xícara. Como deve ser trepar com uma mulher etíope? Fiz a pergunta inconsciente já sabendo a resposta de que era muito bom.
- Senta ai pó! Eu disse.
Francoa o mendigo letrado, ficamos conversando apenas sobre os grandes da literatura clássica, enquanto as pessoas comuns passavam pela calçada sem entender nada. Dois idiotas sentados num café discutindo literatura e filosofia.
- Tentei roubar Ulisses outro dia. Ele disse.
- E como se saiu? Perguntei.
- A escrita do Joyce não é só confusa, aquele livro é muito grande para se esconder embaixo da camisa. Ele disse.
- Francoa, esse é o grande problema.
- Qual problema?
- Não se pode esconder toda essa merda em baixo da camisa.
- Você acha isso mesmo?
- Basta dar uma olhada a sua volta, para confirmar.
Nisso uma senhora passava pela frente do café, puxando por uma guia de couro, um cachorrinho de pelos branquinhos, bem fofinho e delicado, como deve ser um animal doméstico.
- É da coroa que está falando? Ele disse.
- Não é mais profundo, De Profundis, é a respeito do cachorro.
- Você acha que ela o está sodomizando?
- De alguma forma sim, basta olhar para o animal.
- Como está Sofia? Ele perguntou.
- Como uma boa judia casada com um nazista.
- Melhor falar do cachorro dos outros.
- Concordo, somos umas bestas mesmo.
- Umas lesmas!
- Uns vermes!
- Somos idiotas cheios de razão!
- A razão é ser um idiota!
Continuamos nossa conversa enquanto continuava mexendo a pequena colher, bem no meio da xícara
e de todo aquele café. Mulheres etíopes é o segredo.
- O que anda fazendo? Perguntei.
- Preciso roubar Ulisses. Ele disse.
- E depois?
- Por que precisamos de um depois?
- Eu não sei, pensei que o depois justificaria o agora.
- Estamos ferrados.
- Diga isso baixo de forma que o garçom não escute. Do contrario ele vai perder aquele sorriso de 10%.
- Você acha?
- Todo mundo tem um sorriso de 10%. Do contrario como vamos conseguir equilibrar os outros 90%.
- Verdade, pelo menos 10% de esperanças.
O garçom voltou a mesa e foi educado com Francoa.
- O senhor deseja alguma coisa? Ele disse em tom solene e perfeito.
- Meu amigo, desejo tantas coisas que essa mesa e esse café seriam muito pequenos, desejo o mundo. Mas pode me trazer um Ulisses! Ele disse.
- Desculpe não entendi.
- Ele quis dizer um café expresso. Eu disse.
O garçom sorriu achando que estávamos brincando, anotou o pedido e se retirou.
Não se pode brincar com Ulisses, nem com De Profundis, nem com essa merda toda de sociedade. Eles continuam andando com seus cachorrinhos em guias de couro.
(continua 😊) Röhrig C.
O garçom acabou trazendo o café, fiquei ali sentado do lado de fora da cafeteria, o único lugar que ainda se pode fumar. Tudo bem, posso concordar, que o cigarro pode me causar um câncer, mas eu não sou um câncer.
Do outro lado da rua aquela figura sombria meio gótica grunge, teoricamente um mendigo. Atravessou a rua e veio em minha direção. Francoa veio já de longe acenando e gesticulando, com uma euforia digna dele e apenas dele.
- Meu amigo! Ele disse, e abriu os braços para um abraço carinhoso de irmãos.
Olhei seu aspecto e senti o cheiro. Voltei a observar o café na xícara, peguei a pequena colher e dei algumas voltas dentro da xícara. Como deve ser trepar com uma mulher etíope? Fiz a pergunta inconsciente já sabendo a resposta de que era muito bom.
- Senta ai pó! Eu disse.
Francoa o mendigo letrado, ficamos conversando apenas sobre os grandes da literatura clássica, enquanto as pessoas comuns passavam pela calçada sem entender nada. Dois idiotas sentados num café discutindo literatura e filosofia.
- Tentei roubar Ulisses outro dia. Ele disse.
- E como se saiu? Perguntei.
- A escrita do Joyce não é só confusa, aquele livro é muito grande para se esconder embaixo da camisa. Ele disse.
- Francoa, esse é o grande problema.
- Qual problema?
- Não se pode esconder toda essa merda em baixo da camisa.
- Você acha isso mesmo?
- Basta dar uma olhada a sua volta, para confirmar.
Nisso uma senhora passava pela frente do café, puxando por uma guia de couro, um cachorrinho de pelos branquinhos, bem fofinho e delicado, como deve ser um animal doméstico.
- É da coroa que está falando? Ele disse.
- Não é mais profundo, De Profundis, é a respeito do cachorro.
- Você acha que ela o está sodomizando?
- De alguma forma sim, basta olhar para o animal.
- Como está Sofia? Ele perguntou.
- Como uma boa judia casada com um nazista.
- Melhor falar do cachorro dos outros.
- Concordo, somos umas bestas mesmo.
- Umas lesmas!
- Uns vermes!
- Somos idiotas cheios de razão!
- A razão é ser um idiota!
Continuamos nossa conversa enquanto continuava mexendo a pequena colher, bem no meio da xícara
e de todo aquele café. Mulheres etíopes é o segredo.
- O que anda fazendo? Perguntei.
- Preciso roubar Ulisses. Ele disse.
- E depois?
- Por que precisamos de um depois?
- Eu não sei, pensei que o depois justificaria o agora.
- Estamos ferrados.
- Diga isso baixo de forma que o garçom não escute. Do contrario ele vai perder aquele sorriso de 10%.
- Você acha?
- Todo mundo tem um sorriso de 10%. Do contrario como vamos conseguir equilibrar os outros 90%.
- Verdade, pelo menos 10% de esperanças.
O garçom voltou a mesa e foi educado com Francoa.
- O senhor deseja alguma coisa? Ele disse em tom solene e perfeito.
- Meu amigo, desejo tantas coisas que essa mesa e esse café seriam muito pequenos, desejo o mundo. Mas pode me trazer um Ulisses! Ele disse.
- Desculpe não entendi.
- Ele quis dizer um café expresso. Eu disse.
O garçom sorriu achando que estávamos brincando, anotou o pedido e se retirou.
Não se pode brincar com Ulisses, nem com De Profundis, nem com essa merda toda de sociedade. Eles continuam andando com seus cachorrinhos em guias de couro.
(continua 😊) Röhrig C.
Comentários
Postar um comentário